Por Jayme Petra de Mello Neto
Não há como negar que a pandemia gerou uma crise jamais vista em nossa história. O peculiar momento que a humanidade vive fez com que surgisse um comportamento absolutamente diverso do que ocorreu anteriormente.
Só em 2020, mais de 75 mil empresas fecharam suas portas, sendo 98,8% delas de pequeno e médio porte, segundo dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Infelizmente, essa crise ainda tende a crescer e, em meio a um cenário cada vez mais agravante, a preocupação está em evitar falências em massa.
Desde o início da pandemia, algumas ações foram adotadas com o objetivo de minimizar os impactos econômicos. Dentre elas, estão a suspenção dos contratos de trabalho por até 120 dias e uma oferta de crédito com carência de até oito meses para começar a pagar empréstimos por meio do Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (PRONAMPE). No entanto, elas não surtiram o efeito esperado.
As ações implementadas em programas governamentais com caráter moratório para dar fôlego ao caixa, foram por prazo determinado e as contas já começaram a chegar. Para piorar, os índices de contaminação voltaram a disparar e estamos novamente vivendo o fechamento de grande parte do comércio. As reservas financeiras que muitas empresas utilizaram para sobreviver, se esgotaram e o faturamento voltou a despencar.
Neste cenário, algumas precisam recorrer a medidas mais drásticas. Uma delas é a Recuperação Judicial que, embora tenha sua Lei sido revisada no começo deste ano, o texto não trouxe elementos específicos para auxiliar empresários neste momento de pandemia.
Isso ocorre especialmente porque a índole do Direito das Empresas em Crise não gera efeitos para atendimento de situações transitórias e generalizadas, como é o caso da pandemia, mas sim para atender crises de empresas individuais em mercados normalizados. Na prática, seu grande problema é que a solução implica na previsão de uma situação na qual a crise estará superada e que a parte contratual poderá voltar ao mercado normal – além de forçar o empresário, já debilitado e sem caixa na pandemia, a ter que negociar com seu credor em condições de desigualdade.
A Recuperação Judicial, como atualmente concebida na Lei, é um processo extremamente caro e especializado, sendo que poucos escritórios de advocacia efetivamente especializados conseguem conduzir para um bom termo.
Além do custo dos honorários advocatícios, existem outros gastos necessários para a empresa que vai enfrentar a recuperação judicial, como gastos expressivos para um trabalho consultivo; honorários do administrador judicial, custas e despesas processuais, por exemplo.
Do ponto de vista social, é inegável os impactos negativos que um processo como esses trás para a imagem de uma empresa – uma situação que dificulta, inclusive, a concessão de empréstimos de bancos em linhas normais de crédito, com juros e encargos menores.
Em uma situação como a que estamos enfrentando, o fechamento físico de uma empresa pode ser a melhor alternativa para que ela continue no negócio. Talvez valha uma reflexão por parte do empreendedor se não é melhor encerrar as atividades, quitar as dívidas e preservar seu nome pessoal na praça para voltar a atuar em um outro modelo de negócio mais adequado ao mercado atual.
Liquidar uma empresa, a partir de um sistema legal que permita efetivamente o nome limpo pode significar uma rápida e eficiente ferramenta para retomada econômica.
Nesta linha, uma das novidades da reforma na Lei de Recuperação Judicial e Falências é justamente o chamado fresh start, que permite uma volta mais rápida de um empresário que faliu ao universo do empreendedorismo. Precisamos que o mercado absorva essa ideia e suma com a imagem negativa da “falência”, como se fosse uma declaração de incompetência.
Em muitos países desenvolvidos como na grande maioria da Europa e nos Estados Unidos, a liquidação de um negócio débil serve de trampolim para que o empreendedor alce negócios ainda mais ousados e promissores. Existe uma cultura de aprender com os erros e recomeçar. Precisamos desenvolver esse tipo de mentalidade aqui também e continuar seguindo em frente. O empresário falido não pode ser visto como um derrotado sem perdão. No Brasil, esse pensamento faz com que ele tenha que travar batalhas muito mais árduas, jurídicas, econômicas e sociais, se comparado ao restante do empresariado mundial, em prol do soerguimento das cinzas, numa atitude heroica.
Diante desse contexto, o ideal é contar com o apoio de uma equipe multidisciplinar, composta por advogados, economistas e contadores, a fim de avaliar quais são as alternativas para a empresa. Infelizmente, não existe um remédio único capaz de resolver todos os problemas ao mesmo tempo. É preciso analisar caso a caso e contar com a experiência e força de outras pessoas especializadas para superar a crise individual de sua empresa para navegar na crise global da pandemia.
Jayme Petra de Mello Neto é advogado do escritório Marcos Martins Advogados e especialista em Direito cível e societário.
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Fonte: Informa Mídia